quinta-feira, 11 de fevereiro de 2016

Preparação

Bem, assim que decidi fazer o caminho (foi em um final de semana de junho ou julho/15, não lembro ao certo), fiz uma busca na Internet e descobri que na semana seguinte haveria uma palestra online da Associação dos Amigos e Peregrinos do Caminho de Santiago de Compostela do Brasil, em Vila Mariana, São Paulo. Assisti e a empolgação cresceu exponencialmente. Ali obtive uma série de informações, e uma delas foi de que alguns peregrinos iniciam o caminho francês em Roncesvalles, na Espanha, e outros iniciam em Sain Jean Pied de Port, na França, atravessando os Pirineus e a fronteira, e chegando em Roncesvalles no primeiro dia de caminhada. Basicamente, quem escolhe Roncesvalles não quer ou não pode enfrentar os Pirineus, que é considerado como uma das etapas mais difíceis do caminho francês, tanto porque passa por declives e aclives bem grandes e íngremes, tanto por conta do vento, que vem contra. É recomendável não ultrapassar os Pirineus no inverno (e acho que hoje em dia é até proibido), por conta da facilidade em adquirir uma hipotermia e também porque com a neve, você facilmente irá se perder, pois a pista da estrada fica coberta e a visibilidade fica ruim. Na verdade, até em outras estações, você só deverá ultrapassar os Pirineus se o tempo estiver bom, com céu razoavelmente limpo. A neblina atrapalha demais a orientação. Se você fizer uma consulta na Internet, verá que já existiram uma série de problemas e acidentes (sendo alguns deles fatais) com pessoas que resolvem atravessar os Pirineus com tempo ruim.
Na palestra online relatada acima, perguntei se uma carioca suportaria o frio de novembro no Caminho, visto que era o mês que eu teria disponível. O Guilherme, que dirige a associação, disse que era frio, mas nada insuportável, visto que de dia eu estaria caminhando, e de noite estaria dentro do albergue. Também comentou que em outubro o céu é lindo. Se você pesquisar sobre a melhor época pra fazer o Caminho, verá que no verão europeu há super lotação da peregrinação, além de dias maiores e extremamente quentes. Vale lembrar que a peregrinação tem muitos trechos sem cobertura de árvores, então você anda exposto. No inverno é uma época que existem poucos albergues abertos, neve e temperaturas extremamente baixas. O mais ameno é ir no final da primavera ou início de outono. A época que eu tinha disponível era a segunda metade do outono, então cada vez mais os dias iam ficando mais frios. Eu viajei dia 2/11 e cheguei no Brasil no dia 10/12.
Inicialmente, eu não estava muito certa se faria a viagem sozinha, visto que achava um pouco arriscado, por estar em outro país, pela peregrinação em si e pela língua. A minha mãe (também conhecida como Popô) se empolgou pra realizar o Caminho, então achei ótimo, mas achava importante ter alguns dias sozinha, pelo objetivo da introspecção em si. Como minha mãe tem problemas no joelho, estávamos tentando desenhar qual seria a melhor estratégia, talvez sendo que eu iniciasse sozinha, a encontrasse em Burgos, e de lá, ela faria a peregrinação comigo. Ao longo das nossas pesquisas, teve um momento em que ela desanimou (pelo frio e pelo esforço físico), depois se reanimou novamente. E eu, enquanto ia pesquisando e pensando sobre os meus objetivos, cada vez mais ia me convencendo de que precisava fazer esta viagem completamente sozinha. E criando coragem também. Então conversei com ela sobre isso (e chorei um pouquinho depois), e ela entendeu. Por que eu chorei? Não sei! Pelo que tudo isso representava, talvez!
Descobri que no Rio de Janeiro também existe uma unidade de outra associação, a AACS-BR, que realiza reuniões todos os meses na Casa de Espanha. Através do site, solicitei a credencial do peregrino (ela é necessária para realizar o Caminho, pois nela constam os carimbos dos albergues, que comprovam que você está de fato peregrinando) e vi uma lista de peregrinos que fariam o Caminho, separados por mês. Fiquei muito feliz quando vi que uma pessoa iniciaria também no mesmo dia e local onde eu iniciaria: 4/11, em Saint Jean. Imediatamente fiz contato com ele – Claudomiro – que é de Ilha Solteira, SP, e trocamos algumas informações sobre o Caminho.
Consegui ir em 2 reuniões da associação antes de viajar. Na primeira, vi o clima sensacional da associação, com palestras, informações e até lanchinho! Fui surpreendida quando chamaram meu nome no palco (junto com outros peregrinos) para receber a credencial. Colocaram uma vieira pendurada no nosso pescoço e nos deram a credencial do peregrino e um kit cheio de mimos, como mini sabonetes, cordão com a cruz de tau, mini lixa, plásticos para guardar passaporte e dinheiro, protetor auricular, e várias outras coisas! Nos deram boas vibrações e todos rezamos a oração do peregrino:

“Ó Deus, que tiraste teu servo Abraão da cidade de Ur dos caldeus, protegendo-o em todas as suas peregrinações, e que foste o guia do povo hebreu através do deserto, pedimos que abençoe estes teus filhos que, por amor ao teu nome, peregrinam a Santiago de Compostela.
Sê para eles companheiro na caminhada, guia nas encruzilhadas, albergue no caminho, sombra no calor, luz na escuridão, consolo em seus desalentos e firmeza em seus propósitos; para que, guiados por ti, cheguem incólumes ao término do Caminho e, enriquecidos de graças e virtudes, voltem ilesos aos seus lares, cheios de saúde e perene alegria.
Amém.”

Nem preciso dizer que me emocionei, né? Todo o trabalho da associação é muito bacana. A Inês, diretora, transborda amor. Ah, pra quem não sabe, a vieira (ou concha) é um dos símbolos do Caminho, e quase todos os peregrinos andam com ela pendurada na mochila.
 Ao término da reunião, a Silvia demonstrou do lado de fora a montagem da mochila. Ali peguei dicas essenciais. E pra completar, ainda serviram a Torta de Santiago, que é feita de amêndoas. Delícia!

Super feliz com a vieira, concedida pela AACS-BR.

Na segunda reunião, me associei e comprei um nécessaire que pode ser pendurada aberta, com um gancho, essencial para momentos em que não temos onde apoiá-la nos banheiros que encontramos no Caminho. Na hora do sorteio de livros fiz aquele pensamento positivo (já deu certo em diversos sorteios) e ganhei o “Nossos Caminhos no Caminho”, de Pedro Salgado Maia. É o relato da peregrinação de um casal, também no caminho francês. Gostei muito! Como parte da preparação também li “O Guia do Viajante do Caminho de Santiago”, de Daniel Agrela, que minha mãe comprou. Tem várias dicas e informações sobre cada etapa, gostei bastante também. Dei uma olhada em um guia em espanhol que peguei emprestado no clube de montanhismo que sou sócia, a Unicerj, mas esqueci o nome e já devolvi. Cheguei a pensar em levá-lo, pois tem mapas e informações úteis, mas desisti por conta do peso.
E por falar em Unicerj: sou sócia deste clube desde 2007. Quando entrei, fiquei uns 2 anos sendo “rata de montanha”, mas aí a vida de ritmista veio com tudo e começou a ficar complicado, pois sambista dorme tarde, e montanhista acorda cedo. De lá pra cá diminuí muito o meu ritmo, e cheguei a ficar 2 anos sem fazer nenhuma excursão! A meta 2016 é estar pelo menos 1 vez por mês na montanha! A Unicerj é outro lugar maravilhoso, onde se transborda amor e onde aprendi vários valores, através do MASENC (Montanhismo Amador Solidário Ecológico e Não Competitivo).
Queria fazer várias caminhadas através do clube como parte de treinamento, mas só consegui fazer 2: a Travessia Petrópolis Teresópolis em 2 dias (com muito frio e chuva) e o Capucho do Frade. Por falar em caminhar, tinha a intenção de caminhar no estacionamento do Wall Mart aqui perto de casa várias vezes, inclusive com a mochila, mas se fui 2 ou 3 vezes, foi muito. Faltava tempo, estava em uma época muito intensa do trabalho, e tinha muitas coisas pra resolver. Fiz até uma planilha 1 mês antes de viajar com tudo que eu tinha que fazer / resolver, e consegui seguir parcialmente.

Capucho do Frade com a Unicerj.

Travessia Petrópolis Teresópolis com a Unicerj.

Acampamento na Travessia.

Travessia Petrópolis Teresópolis - Dorso da Baleia.

Um dos poucos momentos de boa visibilidade na Travessia.

Cadastrei-me no grupo do Yahoo da AACS, e assim que entro, o assunto que está rolando é que haviam localizado o corpo da Denise Thiem, uma peregrina americana que estava desaparecida desde o início do ano. Nem preciso dizer que fiquei com um pouco de medo, né? Mas fui com medo mesmo! Entendi que foi um fato isolado, que o Caminho costuma ser muito seguro e foquei nisso. Mas eu fiquei alerta. Quando via alguém e suspeitava de algo, eu repetia o mantra que minha mãe me ensinou: “Jesus vai na frente, é o meu guia. Concedo-me a Deus e à Virgem Maria”.
Outro ponto que tive um pouco de medo foi o frio. Escutei alguns comentários como “nossa, quando você for, estará muito frio”, ou “acho que você terá dificuldades de encontrar albergue”, e ainda “você vai virar picolé”. Confesso que fiquei receosa, cheguei a questionar algumas pessoas com experiência no Caminho para tentar me tranqüilizar, e por fim, resolvi fazer um grupo no WhatsApp com as pessoas da lista da associação que iriam no período de outono / inverno. Foi ótimo, pois trocamos várias informações. Conheci outros brasileiros que fariam o Caminho no mesmo período que eu: um casal (Carol e Diogo) que faria o parcial do Caminho Francês (inclusive os encontrei na 2ª reunião da associação em que compareci); Diógenes, que faria o Caminho Português e chegaria em Santiago numa data próxima à minha; Bruno, que começaria 2 dias depois de mim e Flávia, que começaria alguns dias na minha frente. E além desses, vários outros corajosos que iriam em dezembro, fevereiro, e março.
Quanto ao que levar, procurei seguir a lista da associação e comprei uma série de itens, como mochila, bota, saco de dormir, roupa apropriada, etc. Meu carro havia sido roubado após uma trilha em janeiro de 2015, então perdi alguns itens, como mochila e anoraque, e tive que adquirir novamente. É um investimento que vou tirar muito proveito, em virtude da prática do montanhismo.
Bom, a preparação foi essa, em torno de 3 meses. O interessante é perceber que existem pessoas que levam até mais de 1 ano pra se preparar, e pessoas que decidem tudo em menos de 1 mês. Lembro de uma situação na segunda reunião da associação, uma mulher ao meu lado perguntou a quem estava no palco sobre o calçado, a pessoa respondeu que o ideal era usar por no mínimo 2 meses pra amaciar, antes de realizar o Caminho. Ela falou, rindo: “Quê????”. Faltavam 15 dias para ela viajar e nem havia comprado a bota. Quando a encontrei na reunião de janeiro, ela relatou a maravilha que foi o seu Caminho! Não há grandes impeditivos pra fazer o Caminho. Não precisa ser atleta, não precisa ser jovem. Acho que o mais importante é você escutar o seu coração, ter bom senso e conhecer o seu corpo. 

2 comentários:

  1. Respostas
    1. Comprei na loja Subsub, no centro: http://subsub.com.br

      Logo em frente tem outra loja onde comprei muitas coisas também, a AS Divers: http://www.asdivers.com.br/home

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