sábado, 11 de junho de 2016

23/11 – Bercianos Del Real Camino a Mansilla de Las Mulas

O café da manhã do albergue era realmente sensacional. Coloca vários cafés de hotel no chinelo. Não tirei foto, mas tinha cereais diversos, sucos diversos, pão, torradas, biscoitos, ovo cozido, biscoito de milho, bolo, croissant, presunto, queijo, manteiga, margarina, geléias diversas, mel, leite, café, chocolate, iogurte e uns leites com sabores diversos. Além disso, a mesa estava posta de forma linda, tinha um forninho pra esquentar o pão... Espetáculo! Carinho pro peregrino... Tomei café junto com Giovana e Xeli.
A hospitaleira, Rosa, ficou impressionada em como eu estava agasalhada. Ela disse: eu estou só de camisa. Eu disse: eu sou brasileira! Na minha cidade fez 40 graus há alguns dias atrás! Hahaha. Ela nos contou sua história. Como ela falava muito rápido, eu não captei detalhes. Mas ela teve uma doença e esteve entre a vida e a morte, e atribuiu sua cura à São Tiago e ao Caminho. Ela já fez o Caminho 7 vezes e prefere fazer no inverno. Vi as fotos, e a quantidade de neve impressiona! Ela resolveu então abrir um albergue, como forma de agradecimento à cura. Chegou a cogitar várias cidades, mas teve algo de mágico quando ela estava visitando esta casa na qual hoje ela mora e recebe peregrinos. Se não me engano, ela viu estrela cadente quando visitou o local. E decidiu: é aqui. Enquanto ela contava, eu me emocionei, mas segurei o choro, pra não pagar mico. Despedi-me, agradeci muito, e dei um abraço apertado nela. O papo e o café estavam ótimos, mas eu tinha que seguir rumo à Santiago, né?
Comecei a caminhar, o céu estava rosa, lindo. Deixei as lágrimas rolarem. Agradeci a Deus por estar fazendo o Caminho e por ter saúde. Rosa me explicou por onde deveria seguir, mas cheguei a ter dúvidas se estava na direção correta, pois vi uma seta amarela na direção oposta. O casal de italianos vinha atrás, perguntei pra eles, eles disseram que era por ali mesmo.

Rosinha no céu e o casal de italianos.

Que delícia, solzinho chegando...

Eu e meu cajado.

A perspectiva da reta era linda, rumo ao infinito. Árvores secas enfileiradas, solzinho, sem vento, céu azul com algumas nuvens, estava perfeito.... Olhei pra cadeia de montanhas à direita e demorei a acreditar. É isso mesmo que estou vendo? Não creio! As montanhas estão cobertas de neve! Lindo! Pensei: so-co-rro! Iuhuuuuul! Imaginei que nevaria durante meus próximos dias no caminho, pensei em comprar mais roupa para o frio, mas isso acabou não acontecendo.

É isso mesmo? Neve no topo das montanhas?

Chegando em El Burgo Ranero




Que lindo!


A vontade de fazer xixi veio e não tinha nenhuma moita. Teve jeito não, tive arriar ali naquele descampado, e regar o mato! Obviamente fiquei de olho pra ver se não vinha ninguém. Só alguém com um binóculo em uma estrada beeeeeeeem longe pode ter me visto. Hehehe.
Eu estava com uma mente bem mais positiva. Refleti sobre os últimos acontecimentos e entendi que meu Caminho foi desenhado pra mim como tinha que ser.

Onde eu me escondo pra fazer xixi, me diz?



Passarinho.


Árvores enfileiradas.




Morrote abaixo da nuvem.

Morrote agora sem nuvem.

Passei por El Burgo Ranero e Reliegos antes de chegar em Mansilla. Eu andei com uma passada bem rápida, na esperança de achar alguma casa de câmbio, mas não achei. Não cogitei de ir pro albergue municipal, pois Rosa havia comentado que lá não tinha água quente. Acabei sabendo no dia seguinte por outros peregrinos que tinha sim. Fui procurar o albergue Gaia (https://alberguegaia.com/), pois estava com um panfleto que dizia que lá tinha massagem. Perguntei pra uns senhores em uma praça, e eles me indicaram a direção. Falaram: é o albergue novo!



Escultura de vieira na praça e senhores que me deram informação.

Quando cheguei, achei a fachada linda! Toda reformada, e conversa com a fachada da Ermita de La Virgen de Gracia, que fica próxima. Quando entrei, fui encantada. Uma música suave, um incenso aceso... Tudo novinho, arrumado, e uma decoração que você via carinho, cuidado e atenção com detalhes. A cozinha toda equipada, inclusive com utensílios lindos e novos!!! Fiquei a-pai-xo-na-da por este albergue. Não sei explicar...

Ermita de la Virgen de Gracia ao fundo.

7 graus, Ui!

Albergue Gaia. Lindo!

Como minha foto ficou ruim, peguei essa foto na Internet.

Eu fui a primeira a chegar. A hospitaleira foi super simpática! Perguntei pela massagem, mas não tinha.Tomei banho, me acomodei, e perguntei pelo mercado. Ela explicou onde tinha, mas avisou que estava no horário da siesta, então estavam fechados. Eu disse: ah, então vou esperar o horário. Ela perguntou o que eu queria, se estava com fome, porque qualquer coisa poderia me fornecer. Eu disse que não precisava, que estava bem. Mas notei que a cozinha tinha num cantinho um pacote de massa, tempero pronto, pimenta, azeite. Estamos acostumados a encontrar vários mantimentos que os peregrinos deixam pro próximo, mas neste caso, você via que tinha dedo dela ali. Ah, os detalhes... Que gracinha!
Pra esperar o tempo passar, fiquei olhando alguns livros que tinham lá. Tinha um bem grande sobre o Caminho, lindo e com fotos lindas!

Um dos livros que tinham no albergue.

No horário indicado por ela, fui no mercado. Antes passei na ermita e orei. Encontrei o Frederico no mercado, e ele disse que estava no albergue municipal. Como o Bruno havia me emprestado dinheiro, comprei algumas coisas com tranqüilidade, mas sem ostentação. Apenas a comida para 1 ou 2 dias. Aproveitei para conhecer a cidade, me guiando por um desses panfletos que distribuem. A cidade é cercada por muralhas medievais, e isso é bem legal. Amei!



Essa edificação tem alguma relevância histórica pra cidade, só não lembro qual.



Muralhas medievais.















Voltei pro albergue. Giovana e Xeli também se hospedaram por lá. Conhecemos bicigrinos muito simpáticos (peregrinos que fazem o Caminho de bicicleta), e sabíamos que era a primeira e última vez que os veríamos. Esquentei um arroz com camarão pronto no microondas e depois fiz uma sopa pronta também. A hospitaleira nos contou que trabalhava no El Corte Inglês (uma loja enorme que vende de tudo, e possui várias unidades espalhadas pela Espanha), pediu demissão e decidiu abrir o albergue. Contou que o pai chegou a questionar: mais um albergue? Pra que? Mas a verdade é que pelo visto ele super apoia ela (ele estava por lá). Ela mora no andar de cima, e não tinha relação nenhuma com Mansilla de Las Mulas antes de abrir o albergue. Se eu não me engano, ela era de Madrid. Contou que todo o processo de obter o financiamento e fazer a obra durou uns 2 anos, se não me engano (haja paciência e perseverança, né?). Meus olhos brilharam, pensei: quero essa vida, quero ser essa pessoa!

Rango

Durante a conversa, comentaram que os albergues municipais na Galícia não possuem utensílios, apesar de possuírem cozinhas. A alegação dos albergues é de que as pessoas roubam. Acho difícil, porque quanto mais peso, pior pra caminhar, mas sei lá, né? A hospitaleira comentou: você sabe que nunca me roubaram nada? Xeli falou: sorte a sua! Comentamos sobre o tempo, a hospitaleira (que também já foi peregrina) comentou que neste último dia houve queda de temperatura (por isso a neve no topo das montanhas), mas que a temperatura já estava subindo, então a neve se derreteria rapidamente. Comentou que em Roncesvalles (a cidade onde eu cheguei no primeiro dia de caminhada, lembra?) estava tudo coberto por neve. Dias depois vi no facebook do albergue a foto que ela postou de Roncesvalles coberto de neve. Choquei! Ela comentou do perigo de atravessar os Pirineus com tempo ruim. Contou que em um de seus Caminhos, resolveu atravessar, não avaliando que o tempo estava tão ruim. Em 15 minutos de neve, a pista ficou coberta e acabou sua orientação. Por isso, ela retrocedeu.

Foto de Roncesvalles neste dia. Wow!
Neste dia, eu senti uma dor no dedo que parecia que eu tinha uma pedrinha no sapato. Mal sabia que era o começo de um tormento, hahaha!