De fato aconteceu o previsto: na reta final do caminho, novos peregrinos surgem, principalmente os
espanhóis. No começo do dia conheci o Francesco, muito simpático e que gostava de conversar. Se
eu não me engano, ele estava começando ali em Sarria, ou em alguma cidade
anterior mais ou menos próxima. Disse-me que já havia feito o Caminho Francês
até ali em outro ano, e que agora estava completando. Falou a respeito da crise
na Europa, disse que era profissional de TI, mas que agora trabalhava como
garçom. Concordamos sobre o desejo de fazer o Caminho mais vezes. “Quanto tempo
depois?”, indaguei. Ele disse: dizem que o corpo pede. Concordamos que 3 anos
era um intervalo razoável.
Não lembro
se foi nesse dia ou em algum dia anterior que conheci o Vicente, um senhor
espanhol budista. Mas diversas vezes caminhei com ele próximo. O dia foi de
visuais incríveis, fazendo eu me apaixonar cada vez mais pela Galícia. Teve
sol, eu estava feliz...
Fiquei sabendo que dia 8/12, dia
de Imaculada Conceição, era feriado na Espanha. A data cairia numa terça-feira.
Dia 6/12 é dia da Constituição Espanhola, também feriado, mas cairia num
domingo. Porém os espanhóis “transfeririam” o feriado para segunda-feira, e
emendariam um feriadão. Portanto, muitos espanhóis estariam aproveitando o
feriadão para fazer trecho do Caminho. E seria um dia de festa na cidade, e
provavelmente a catedral ficaria bem lotada. Além disso, no dia de Imaculada
Conceição haveria botafumeiro na Catedral em Santiago. O botafumeiro, pra quem
não sabe, é um incensário gigante que é balançado em certo momento da missa na
catedral, porém isso só ocorre nas missas de 19:30 nas sextas-feiras e em datas
comemorativas. Se tudo acontecesse normalmente, eu chegaria em Santiago no dia
7/12. A minha intenção era fazer um bate-volta em Finisterre no dia 8, mas
depois dessa informação do feriado, festividades e botafumeiro, decidi deixar
Finisterre para um próximo Caminho.
Francesco também falou todo
empolgado que o legal seria dormir no Monte do Gozo na véspera da chegada em
Santiago, para chegar na catedral logo pela manhã. O Monte do Gozo é um local a
4 km de Santiago de Compostela, e de fato li relatos do quão bacana é dormir
por lá na última noite. Francesco chegou a dizer que amigos relataram a ele que
os hospitaleiros do albergue municipal do Monte do Gozo eram brasileiros, que
faziam feijoada e que por lá rolava sinuca! Eu fiquei maravilhada, mas pesquisei
na Internet e vi que ele estava equivocado, ele confundiu com outra cidade do
Caminho na qual de fato isso acontecia. Se eu dormisse no Monte do Gozo, só
chegaria em Santiago no dia 8, no dia das festividades, talvez estivesse meio
confuso e cheio, e não teria 1 dia inteiro pra curtir a cidade, visto que no
dia 9 eu voaria de volta pro Brasil. Decidi não dormir no Monte do Gozo. Mas
pensei: quem sabe não dou sorte de ter botafumeiro no dia 7? Desta forma eu
posso ir a Finisterre no dia 8! Enfim, eram muitas dúvidas, eu queria tudo, mas
tinha pouco tempo disponível, hehehe...
Passamos por Barbadelo, Rente,
Brea, Ferreiros, As Rozas e Vilachá e
subimos uma grande escadaria ao chegar em Portomarín. Fomos pro albergue
municipal, mas lá não tinha Wifi. Decidi procurar um albergue privado, e
Francesco também. Vicente, Giovanna e Xeli ficaram por lá. No albergue (Casa
Cruz) reencontrei Christian (o peregrino que urrou na mesa de massagem em Los
Arcos). Achava que ele já estava bem à minha frente, em função do ritmo de
caminhada dele, mas ele relatou que teve algumas dores. Uma peregrina espanhola
que conheci dois dias antes também se acomodou neste albergue. Conheci uma
dupla de sogro e genro, bem como um peregrino dinamarquês. O sogro estava com sérios
problemas em seus pés. Conversavam sobre a possibilidade dele fazer o próximo
trecho de ônibus.
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Bruxinha |
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A escadaria. |
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Ufa! |
Com a dificuldade da pronúncia do
meu nome na Espanha, eu simplificava pras pessoas falando meu apelido, “Jana”.
Francesco simplificou para Joana (nome que existe na Espanha) e
consequentemente os outros espanhóis também ficavam me chamando de Joana.
Depois de descansar, tomar banho
e etc, fui no bar que pertencia ao albergue para comer algo. Estavam todos lá
bem animados, conversando, bebendo e comendo. O peregrino dinamarquês pelo
visto havia bebido um pouco além da conta e importunou a atendente, que era
extremamente simpática, mas não estava ali para flertar. Ele chegou a puxar ela
pela cintura, ela se esquivou e foi bem educada (eu não seria). O cara tinha
essas atitudes agressivas e equivocadas e ainda fazia vários comentários
machistas. Sério, me deu preguiça e indignação. Comi um hambúrguer meio sem-graça e voltei
pro albergue.
Não bastasse terem comido no bar,
eles compraram queijos, chorizo, salame, pão, vinho, prepararam omelete com
batatas e chamaram a mim e a peregrina espanhola pra esse rega-bofe tipicamente
espanhol no albergue. Foi muito bacana, se não fosse o peregrino dinamarquês
com seus comentários desnecessários. Depois de um tempo deixamos de falar inglês,
passamos a falar em espanhol e português (não propositalmente, foi natural), e ele ficou
bem bolado.
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Rega-bofe espanhol. |
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Um brinde ao Caminho de Santiago! |
Neste dia, quando me comuniquei
com minha mãe, irmã e namorado, disse que só faltava 1 semana para que
voltasse, e que eles se preparassem, pois ia enchê-los de beijinhos!